Márcia Atik

Parece incrível! Nessa época em que se cansou de falar em liberdade sexual; em que o desejo é propriedade de cada ser humano; que as repressões, embora ainda existentes, não têm tanto efeito punitivo; cada vez mais os consultórios de terapeutas sexuais têm recebido homens e mulheres com queixa de baixo ou nenhum desejo sexual, o que chamamos de desejo hipoativo.

Nas mulheres era praxe ouvir essa queixa, muito mais por repressões e culpas sociais do que por disfunção sexual. Nada que um papo, um pouco de reeducação sexual e esclarecimento de algumas dúvidas não resolvesse.

Porém, o que chama a atenção atualmente é que são os jovens sexualmente ativos e frutos dessa geração criada com a liberdade de perceber e vivenciar seus desejos, principalmente sexuais, as principais vítimas dessa disfunção.

O lado bom é que a procura por ajuda ocorre com mais facilidade. Melhor assim do que empurrar para baixo do tapete a insatisfação através orgasmos fingidos ou relações sexuais evitadas pelos mais variados pretextos e pela dificuldade em admitir para seus parceiros que algo não vai bem.

Sabe-se que hoje 35% dos brasileiros são acometidos desse mal, a maioria mulheres.

Esse nome pomposo “desejo hipoativo” significa a ausência completa ou diminuição do desejo de ter atividade sexual e como conseqüência resulta na falta de intimidade ou de reciprocidade vista por olhos menos atentos como a causa, mas que na maioria dos casos não é bem assim. Pois é exatamente o sintoma menos valorizado que decifra o enigma.

Isso ocorre por falta de comunicação ou mesmo de percepção, uma vez que os sintomas são diferentes para cada caso.

A simples falta de fantasias sexuais e dificuldades em relação ao orgasmo - nas mulheres falta de lubrificação vaginal ou ereção nos homens – propiciam crises entre o casal e por si só já chamam a atenção e pedem que se use o sinal amarelo para evitar que a relação desça ladeira abaixo.

Na maioria dos casos as causas são emocionais, como dificuldades de fazer vínculos sólidos, insatisfação com a vida ou profissão, medo de desempenho, valorização de aspectos negativos em relação à sexualidade e infinitos fatores com origens inconscientes.

Também podemos enumerar causas vinculadas aos desequilíbrios hormonais. Mas uma orientação médica auxilia e muito nas doenças crônicas onde há medo, dor, insegurança e que também podem interferir no desejo. Mas se bem orientados os pacientes se fortalecem e conseguem resgatar sua auto-estima e o desejo de viver e compartilhar.

É comum as pessoas com inibição do desejo sexual confundirem causas e conseqüências para justificar não ter relações. A pessoa diz que evita o sexo porque tem ejaculação precoce ou por não ter ereção, quando na verdade, isso acontece, justamente pela falta de desejo sexual.

Mas o que mais me mobilizou a escrever sobre isso foi perceber que as doenças não são as maiores causadoras de desejo hipoativo nos nossos dias.

Infelizmente pela experiência no consultório percebemos que a dependência de drogas, fumo, álcool e das pílulas mágicas, que cada vez mais facilitam a vida daqueles que preferem o caminho mais curto e ilusório da felicidade.

Isso sem falar no flagelo dos inibidores ou moderadores de apetite. Pesquisas recentes demonstram que o uso de anfetaminas inicialmente intensifica o desejo, porém, em doses crônicas, tem o poder de anulá-lo.

A generalização do termo ansiedade e depressão também fazem com que se vulgarizem sintomas importantes que interferem na libido.

O tratamento de desejo hipoativo é complexo, pois essa disfunção envolve inúmeros fatores, proporcionais a infinidade de reações físicas e emocionais que existem entre nós seres humanos.

Além disso, a queda da libido apesar de altamente frustrante é na maioria das vezes relegada e se cristaliza com a falta de tratamento.

Esse tratamento pode ser através de medicação, orientada por um médico de confiança, geralmente baseada em derivados de hormônios, que embora clássica na medicina traz alguns inconvenientes pelos efeitos colaterais.

Já a psicoterapia é um processo de autoconhecimento e de releitura da própria vida, na qual se faz um trabalho de reeducação sexual, mas principalmente um trabalho de resgate de si mesmo e da função do desejo na vida global dessa pessoa. Não é restrita apenas à sexualidade, pois não há temor em afirmar que 100% dos pacientes com desejo sexual hipoativo tem também um empobrecimento da sua mentalização e é quase que totalmente incapaz de levantar os pés do chão e balançar as asas coloridas ao sabor do vento.

Psicóloga clínica, conferencista, com especialização em Sexualidade, Terapia de Família e Casal, Transtornos Alimentares e Doenças Psicossomáticas, Márcia Atik tem vasta experiência na área, seja atuando em consultório, coordenando grupos, ministrando palestras em escolas, empresas, associações, sindicatos, prefeituras e demais organizações. É membro do Centro de Estudos e Pesquisas do Comportamento e Sexualidade (CEPCOS).
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